Há comentários sussurrados em cada esquina. Na povoação da Lapa, perto do Cartaxo, não há quem não fale do "rapto" de 120 gatos, ocorrido há 15 dias. Maria Antónia Lisboa tinha 120 felinos dentro de um anexo com cerca de 8 metros quadrados. No dia 15 de Julho, um grupo de "amigos dos animais" aproveitou a sua ausência e invadiu o barracão onde os bichos estavam fechados. Quando Maria Antónia regressou, encontrou o espaço vazio.
A dona já se queixou à polícia e não consegue evitar as lágrimas: "Eram os meus gatinhos. Nunca lhes quis fazer mal. O sítio onde estavam podia não ser o melhor, mas era provisório." Os vizinhos falam em surdina mas, quando ela se afasta, levantam a voz para dizer o pior. Que o cheiro é insuportável. Que também há cães - e muitos - fechados dentro de casa. Que não se admite ter animais "naquelas condições". Por seu lado, a "porta-voz" do grupo que levou os gatos - e que recusa identificar-se -, não fala em "rapto" mas em "salvamento". E garante que nunca tinha assistido a tamanha barbárie.
Maria Antónia Lisboa tem 42 anos e afiança ter dedicado toda a vida aos bichos. Solteira, sem filhos, constituiu há seis anos a associação A Colina, "com o objectivo de minimizar o flagelo dos animais abandonados". Sem nunca ter conseguido um espaço para servir de morada aos animais, Maria Antónia foi levando um a um para o seu apartamento na Amadora. Em Janeiro, os vizinhos fizeram queixa do cheiro e do barulho e a Câmara Municipal da Amadora, ao constatar que viviam 60 gatos no apartamento, emitiu uma ordem de despejo. Em três semanas, a dona dos felinos teve de encontrar uma solução. E levou-os, primeiro para uma cave de uma pessoa amiga, depois para o anexo na Lapa, Cartaxo, propriedade de um vizinho dos pais. "Não era o ideal em termos de espaço mas era provisório. Eu estava a construir um gatil com todas as condições. Dentro de um mês podia levá-los para viverem condigamente."
Maria Antónia recusa-se, porém, a indicar o local do gatil em construção. "Para quê? Para me virem roubar os meus gatos outra vez, mais tarde?" A recusa é compensada com uma visita ao anexo de onde os 120 gatos foram levados. O fedor sente-se a vários metros de distância mas no seu interior é quase impossível de suportar. Há excrementos por todo o lado, sofás revirados, gaiolas de animais imundas e paredes castanhas que impressionariam qualquer um. Milhares de pulgas alegram-se com a chegada de visitantes.
Além dos 60 gatos, Maria Antónia acabou por herdar mais 30 de um senhor que não sabia o que lhes fazer: "Um dia ligou-me um senhor muito aflito porque os pais tinham morrido e ele queria livrar-se de 30 gatos. Ligou-me desesperado porque já tinha pedido ajuda a várias associações, à União Zoófila, entre outras, e ninguém quis saber. O que é que eu ia fazer? Abandoná-los? Não. Fiquei com eles." É justamente aqui que entra o grupo de "salvadores". Sofia, "porta-voz" do grupo, explica: "Andávamos a tentar ajudar o senhor a encontrar um lar para os seus gatos, quando soubemos que ele os tinha entregue a alguém. Telefonámos à senhora, e ela recusou-se a dizer onde tinha os gatos, e recusou qualquer tipo de ajuda. Daí até termos descoberto aquela barbárie foi um passo."
O grupo que perpetrou o "rapto" no passado dia 15 de Julho mantém-se no maior dos secretismos mas divulgou o acontecimento num site na Internet (www.felinus.org) e em mails enviados para várias associações e demais "amigos dos animais" (ver texto na página seguinte). Sofia sabe que o acto em si contém algumas ilegalidades mas afirma que voltaria a participar no salvamento sem pensar duas vezes: "Se esperássemos pelos meios legais, os bichos morreriam todos. A nossa consciência está tranquila. Tratava-se, até, de uma ameaça para a saúde pública. Agora a senhora chora a falta dos gatos? Os animais estavam a morrer, em condições inacreditáveis."
Os vizinhos ouvem a conversa com Maria Antónia Lisboa e aproximam-se assim que ela vira costas. "Isto é um cheiro que não se pode! Agora só falta levarem os cães!", dizem várias vozes, entre as quais a de Sebastião Carvalho, de 66 anos. "Não é assim que se gosta dos bichos!"
Não é julgar; isto é um facto: um atentado aos direitos dos animais. O mal disto é só um: maus tratos a animais não é considerado crime. Se fosse a mulher já estava presa. Admira-me muito "os amigos" não a terem ajudado no seu internamento num hospicio... mas devem ser daquelas pessoas que não gostam de animais porque presenciaram esta cena e ficaram impávidas e serenas. É como aquelas pessoas que vão na rua e veem um gato a morrer e que fazem?! Pegam e levam ao vet? Olham á volta e discretamente dão-lhe com o pé encostam-no ao passeio...
Como é possível uma situação destas? Pobres bichos, a viverem há tanto tempo num local tão imundo sem carinho nem um pouco de dignidade! Mas para onde foram estes animais? Será que estão melhor agora? Será que já arranjaram donos? Será que estão bem? Ou estarão num canil semi-abandonados numa qualquer jaula? Há alguém que saiba mais informações do desenrolar desta história? Essa senhora deveria de ser internada!
Eu não gosto, por questões de feitio e de ética, falar do que não sei. Tentando analisar este caso, tão friamente quanto a delicada situação o permite, e mesmo admitindo que a D. Antónia no fundo goste de animais, julgo que terá a dada altura perdido claramente o controlo da situação. Não quero criticá-la e menos ainda julgá-la. Questiono-me se deveria ter sido ajudada e não foi, se não deu os passos certos, na hora certa... e não encontro respostas. Não conheço a senhora em questão, e imagino o seu desespero, mas penso sobretudo que mais uma vez os animais acabaram por ser as vítimas, e isto dever-nos-ia levar a pensar a todos. Às vezes querer fazer o bem nem sempre resulta se não soubermos dizer não às nossas limitações. Eu tenho só 3 animais, mas apenas porque não tenho condições de ter mais, porque também gostava de salvá-los a todos,; procuro pois encontrar soluções alternativas (não os levo todos para casa, mas dou-lhes comida, arranjo-lhes um lar, levo-os ao veterinário...). Um abraço a todos e felicidades para os animais resgatados. Eugénia
Eu não consigo, por feitio e ética, falar do que não sei. Tento analisar, tão friamente quanto a delicada situação o permite, esta situação e mesmo admitindo que a D. Antónia no fundo goste de animais, perdeu claramente o controlo da situação. Se deveria ter sido ajudada e não foi, se não deu os passos certos, na hora certa, não sei. Só sei que os animais acabaram por ser mais uma vez as vítimas e isto deveria fazer-nos pensar a todos. é que às vezes querer fazer o bem nem sempre resulta se não soubermos dizer não às nossas limitações. Eu tenho e animais porque não tenho condições de ter mais, e mesmo querendo salvar todos, encontro soluções alternativas (não os levo todos para casa). Um abraço a todos e felicidades para os animais resgatados. Eugénia
concordo inteiramente que esta situação configura doença mental compulsiva. Eu penso que o "rapto" foi correcto e não teria problemas em participar. Há coisas que não podem esperar
Não conhecia esta situação, realmente não chega tentar recolher animais eles necessitam de condições dignas e pelas fotografias não as tinham, realmente era necessário fazer alguma coisa.
O que me deixa furiosa é muitas associações ainda mencionarem A Colina nos seus links e o site ainda continuar no sapo... Essa mulher não tem mesmo vergonha.
Esta senhora é o que se chama de "animal hoarder", ou "coleccionadora de animais". Não se iludam, isto é uma perturbação mental grave e, como se pôde ver, quem pagou foram os animais.
Oxalá salvem os cães em breve. Não pelo cheiro que tanto incomoda os vizinhos, mas pela dignidade que eles merecem.