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Circo e maus tratos



As características itinerantes do circo impedem que haja boas condições para os animais.

Que o sofrimento dos animais é muitas vezes ignorado e desconhecido, já cá se sabia. Mesmo o que é gritante nesta matéria parece banalizar-se e entrar nos hábitos, como se fosse aceitável. O abandono de milhares de animais de companhia espelha bem a falta de civismo e de compaixão que, infelizmente, é apanágio de uma boa parte dos nossos concidadãos.

E isso envergonha-nos a todos, até porque , ano após ano, apesar de todos os alertas e apelos, a situação se mantém e agrava. Pais extremosos deixam na rua o animalzinho que durante meses fez as delícias dos filhos, porque estorva a ida para férias.

Caçadores-proclamados amigos do cão, companheiro de jornadas cinegéticas, não se importam de o abandonar no monte, quando está velho ou doente, para morrer de fome e de frio. Tudo isto existe, tudo isto é habitual!

Mas outros casos passam mesmo despercebidos, mesmo aos mais atentos, talvez porque ocorrem dentro de portas, a bom recato - e até no seio de instituições que não imaginaríamos capazes de tais delitos.

Aproveitando a celebração de mais um Dia Mundial do Animal - na mesma data que a Igreja consagra a S. Francisco de Assis, aliás padroeiro dos ecologistas - uma associação, a "Animal", com sede no Porto, veio a terreiro fazer uma grave denúncia em muitos circos portugueses, maltratam-se e torturam-se os animais que animam os espectáculos. Cruel desilusão para os que recordam o circo como um cenário quase mágico, cheio de fantasia e de mistério! A realidade é bem mais sórdida, pelos vistos.

A associação Animal fez um trabalho em profundidade - visitou dez circos, durante um ano, e um dos investigadores esteve durante quinze dias infiltrado, como trabalhador, num conhecido circo, o Soledade Cardinalli. Foi gravado um vídeo que documenta comportamentos degradantes.

Mas bastará citar um pouco do que sobre o assunto foi reportado pelo JN " ...a câmara oculta co-lheu imagens da própria dona do circo a chicotear póneis. Um destes animais, aliás, apresentava uma ferida numa das patas, coberta de moscas e carraças. Victor Hugo Cardinalli também foi filmado, em pleno espectáculo, a picar elefantes com um aguilhão e o dono do circo Atlas, Walter Dias, foi visto a ministrar uma injecção a uma leoa, sem a devida supervisão de um veterinário, como manda a lei."

O resto... o resto são condições de alojamento e de transporte verdadeiramente miseráveis, jaulas exíguas, sede e fome para animais que era suposto serem " estrelas" da arte circense.

Enquanto se aguarda, da parte dos visados, algum esclarecimento e a defesa a que têm direito, a "Animal" tira consequências destas iniquidades - e apela aos cidadãos para que boicotem as companhias de circo que assim abusam dos animais e do seu direito ao bem-estar e à dignidade. As autoridades não devem também alhear-se deste problema, porque são muitas as ilegalidades a tirar a limpo - e a punir, digo eu.

A verdade é que a utilização de animais, selvagens e mesmo domésticos, em espectáculos, não se pode fazer sem sofrimento e exploração abusiva, mesmo descontando estes casos extremos de crueldade e sadismo - que de resto não parecem ser excepção.

As características itinerantes deste tipo de actividade impedem por si só, dizem muitos, um mínimo de condições que assegurem a sanidade física e psíquica dos animais, alguns dos quais, coisa estranha, pertencem a espécies protegidas por lei. O circo pode viver e criar sem animais forçados a um penoso e árido cativeiro, escondido pelas luzes feéricas das grandes tendas onde milagres acontecem. A "Animal" pede ao Parlamento que legisle em conformidade. Veremos o que acontece.

por bernardino guimarães ambientalista




http://jn.sapo.pt/2005/10/18/grande_porto/circo_e_maus_tratos.html

- Becas (Fernanda Ferreira) [ Europe/Lisbon ] 2005/10/19 08:47

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