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Este Natal apadrinhe um gato ou um cão

http://www.acapital.pt


Autor: Pedro Lopes



União Zoófila lança campanha de natal para apadrinhamento de animais

DIZ-ME QUEM ABANDONAS, DIR-TE-EI QUEM ÉS

E se neste Natal oferecesse aos seus amigos um gato ou um cão como afilhado? Esta é uma das mais recentes campanhas da União Zoófila que procura assim melhorar as condições do seu gatil e canil onde quase mil animais esperam dono ou padrinho. Então, porque não surpreender um amigo e familiar oferecendo-lhe um diploma, com a foto do adoptado? A Capital deixa-lhe a sugestão e também o retrato de como vivem os animais abandonados no nosso país

TEXTO DE RAQUEL GOMES FREIRE*



Quase todos os dias nos cruzamos com animais abandonados, perdidos, famintos, com um olhar triste, que nos seguem na esperança de serem adoptados. Não importa quem, qualquer pessoa que se detenha para lhes dar carinho serve para seu dono. Não têm muito por onde escolher. Qualquer outro sítio é melhor do que o frio das noites ao relento, qualquer comida é melhor do que os restos que rebuscam junto de caixotes do lixo. A casa mais humilde vale por todas as ruas em que deambulam e adoecem, por qualquer via rápida mortífera onde se perdem, morrem, e cuja decomposição nos flagra e choca num relance que dura alguns segundos. A esperança média de vida é curta, ou porque adoecem, ou são atropelados ou “encontrados” por funcionários dos canis municipais.
Felizmente, nem todo o cenário é negro. Ainda existem algumas associações dedicadas à causa dos animais. Que os acolhem e alimentam, tentado dar-lhes algo parecido a um lar. A missão não é fácil, quer por falta de verbas, quer pelo número crescente de animais abandonados que lhes são confiados. Morte dos donos, idas para lares, nascimento de um filho, cães de caça que deixam de servir para tal, são as principais situações que levam ao abandono da maioria destes animais. A tendência para o abandono tende a aumentar.

ADOPÇÕES. A União Zoófila é uma dessas associações, fundada há mais de meio século, em 1951. Esta associação de utilidade pública administrativa não tem quaisquer fins lucrativos, regendo-se apenas pelos seus estatutos. Lucros não há, apenas um apertado orçamento anual proveniente das quotas dos seus associados, «muitas delas em atraso», e de donativos de uma qualquer alma filantrópica, defensora da causa dos animais.
Os verdadeiros lucros materializam-se aqui sob a forma de adopções, esse é o verdadeiro ganho. «É sempre uma grande vitória e uma enorme alegria quando conseguimos encontrar pessoas dispostas a levar estes animais, dando-lhes um lar e o carinho que há muito perderam».
Quem o diz é Luísa Santos, uma senhora de sorriso afável, na casa dos 60, tradutora de profissão e voluntária neste instituição há mais de vinte anos «por um amor incondicional aos animais».
Em casa tem três gatos e só não tem mais porque não pode. No entanto, é no gatil desta associação que se sente realmente útil. Ali, os quase duzentos gatos abandonados são tratados como se fossem os seus.
As ajudas por parte do estado são nulas, provavelmente por já existirem canis e gatis municipais a tratar deste problema.
A principal diferença é que um animal recolhido pelos serviços da câmara, têm na morte o destino mais certo, isto se durante um determinado prazo ninguém aparecer a reclamá-los, o que acontece na maior parte dos casos.
Já na União Zoófila a política é outra. «Somos totalmente contra o abate, a não ser que o animal esteja já num grande sofrimento, então aí sim, optamos pela eutanásia», explica-nos Luísa Santos, como que se de seres humanos estivesse a falar.

VIDA DE CÃO. Apesar dos constantes esforços por parte da UZ, muitos animais adoecem, para além daqueles que já chegam doentes, feridos, maltratados ou estropeados. «Há pessoas completamente desumanas. Nem imagina o estado em que alguns destes bichinhos aqui chegam. Às vezes parece impossível que consigam sobreviver», diz-nos o senhor Manuel, outro dos voluntários. Ainda assim, e mesmo que estes padeçam de doenças incuráveis «tentamos sempre salvá-los e fazer os possíveis para dignificar a vida a estes seres, ainda que seja no leito da morte», acrescenta.
Aqui dá-se valor à vida, respeitam-se direitos. São animais, sim, mas são também seres vivos que, apesar da ausência de racionalidade, característica que os diferencia de nós, conseguem muitas vezes parecer mais humanos do que alguns homens que mais se assemelham animais.

GATIL/CANIL. O albergue da União Zoófila acolhe cerca de 800 cães e 200 gatos. Logo à entrada deste espaço somos confrontados com uma adaptação de uma velho ditado popular que nos dá que pensar: «Diz-me quem abandonas. Dir-te-ei o que és».
Ao percorrer a galeria de boxes deste espaço, uma espécie de bidon-ville de animais de estimação, o barulho vai-se aos poucos tornando ensurdecedor, envolto numa sinfonia de latidos e miados descoordenados, desafinados, desesperados.
É impossível não sentir um valente nó no estômago e uma imensa sensação de impotência quando somos confrontados com centenas de olhares tristes, agitados e ansiosos uns, outros revoltados, mas todos eles sem brilho e à espera de algo ou de alguém que tarda em chegar.
São 800 cães, muitos deles velhos, cegos, coxos, doentes. Pedem-nos festas, atenção, fixando-nos com os seus olhos tristes.
É fácil deixar um cão ou um gato numa instituição destes género, voltar as costas e pensar que vão ficar bem, que irão arranjar novo dono mas, se por um lado existem casos de sucesso, de cães e gatos que rapidamente conquistaram novas casas, outros há que ali estão há mais de dez anos, sem qualquer esperança, que se resignaram a este local como a última casa por onde vão passar. Morrerão sem nunca terem voltado a saber o que é ver o sol sem ser através de grades. É esse o caso do velhinho Herman, um rafeiro pequenino, castiço e já sem idade. «Pode fazer-lhe festinhas que ele é bonzinho», diz a dona Isabel, «o coitadinho teve um AVC a semana passada, é dos mais antigos, já está muito cansado, não é Herman?».
Quando nos aproximamos de alguns, estendendo a mão para acariciá-los, escondem-se desconfiados ou fogem com o rabo entre as pernas. «Essa gata é muito assustadiça, fizeram-lhe muito mal, não se pode fazer movimentos bruscos porque pensa logo que lhe vão bater», explicou-nos uma das auxiliares. Esta não tinha uma orelha, cortaram-lhe a cauda, e tem fiv, uma doença incurável, conhecida por “sida dos gatos”. Felizmente foi apadrinhada, por uma jovem que vem visitá-la e que contribui todos os meses com 13 euros para que lhe possam ser garantidos os cuidados necessários. «Muitas pessoas não podem adoptar animais, ou porque já têm vários, ou porque vivem em pequenos apartamentos, ou não têm tempo para dedicar-lhes, é um sem fim de impedimentos. Foi por isso que nos lembramos de criar este programa de apadrinhamentos», explica a dona Isabel. (ver caixa)
Ter um animal de estimação hoje em dia sai caro. Tanto o senhor Manuel como a dona Isabel não percebem, por exemplo, porque é que as despesas em veterinários «não são dedutíveis no IRS como já acontece noutros países, ou porque é que determinadas rações vendidas no nosso país têm um IVA de 19 por cento, enquanto noutros, a mesma ração, da mesma marca, ronda apenas os por cento.»
Já agora, acrescenta-se, porque é que o Estado não colabora com algumas destas instituições em termos financeiros?




ESTE NATAL VENHA APADRINHAR UM CÃO OU UM GATO

Por saber que determinados animais terão dificuldades em ser adoptados, a UZ criou uma galeria de apadrinhamento, modalidade que não só contribui para a protecção dos animais como também serve para, através de um valor mensal, cobrir parte das despesas que a associação tem com cada um destes animais. A propósito da época natalícia, a UZ lançou a campanha “Este Natal ofereça um afilhado”, que consiste na oferta do apadrinhamento de um gato ou cão. Como prenda, é oferecido um diploma com a fotografia do bicho apadrinhado.

Quem?
Os candidatos a apadrinhamentos são todos os animais da União Zoófila, pois a escolha fica ao critério do padrinho ou madrinha. É importante e necessário que sejam apadrinhados, em primeiro lugar, os animais mais carenciados e com menos chances de serem adoptados: os mais velhos, os doentes, aqueles com características particulares em termos de personalidade e os que por algum motivo foram maltratados e têm marcas físicas.
Como?
No site da UZ: www.uniaozoofila.org, existe uma galeria de fotografias. Caso encontre o animal que deseje apadrinhar, só tem de preencher a ficha de apadrinhamento que se encontra nesta página e enviar para a sede por correio junto com o respectivo cheque à ordem da associação.
Quanto?
O valor do cheque depende da opção de pagamento que escolher.
Poderá ser trimestral/ semestral ou anual. O valor da quota de apadrinhamento é de 13 euros /mês para cães e 8 euros/mês para os gatos. O custo que um animal representa para a associação é muito superior ao que aqui é apresentado, por isso estes valores são considerados simbólicos.
Direitos e deveres:
Os padrinhos e madrinhas são também livres de contribuir para outro tipo de ajudas ao animal tais como vacinas, esterilizações, castrações, banhos, tosquias, etc. Também têm o direito de saber o estado de saúde do animal caso este sofra alterações. O animal terá registado na sua ficha o nome do seu padrinho/madrinha. O valor pago pelo apadrinhamento é dedutível no IRS e o padrinho receberá periodicamente uma fotografia do seu “protegido”. Não existe uma obrigação da pessoa que apadrinha. Digamos que este é um compromisso moral que a pessoa assume para com o animal. Uma forma de ajudar a melhorar as condições daquele animal dentro do albergue.


SIDA FELINA

Na UZ há um cantinho muito especial, só para gatos. Chamam-lhe o Cantinho FIV, ou seja o lugar onde ficam os gatos que contraíram a Síndrome da Imunodeficiência Felina, vulgarmente conhecida como a sida dos gatos. Esta é uma doença que afecta apenas estes felinos e que não pode, em caso algum, ser transmitida aos homens. No caso de infecção com FIV, o prazo para aparecimento dos sintomas pode demorar até cinco anos. A infecção por este retrovírus leva à diminuição progressiva e ao desaparecimento das respostas imunitárias do animal, privando-o das suas defesas contra agentes infecciosos, conduzindo inevitavelmente à morte do animal. O vírus transmite-se apenas pela contaminação sanguínea e não há cura conhecida. Uma das formas de ajudar a melhorar as condições de vida dos habitantes do cantinho FIV é apadrinha-los. No site da associação felinus, www.felinus.org, poderá obter mais informações sobre como fazê-lo.




O DESTINO DE MARIA: UMA HISTÓRIA DE ABANDONO

Há casos de cães e gatos que acabam por morrer passados alguns meses, às vezes semanas, depois de terem dado entrada na instituição. Não necessariamente por estarem doentes, mas pela forma como interiorizaram o abandono de que foram vítimas.
«O pior para estes bichos é a sensação de abandono», garante Luísa com um semblante mais carregado. Alguns deles entram até em depressão profunda - é verdade, os animais também têm direito a depressões. «A falta do dono, da casa em que sempre viveram, das atenções e carinhos que um dia lhes foram abruptamente retirados, levam-nos muitas vezes a desistir de viver».
A sensação de abandono é a morte de muitos. A alcofa e os brinquedos de outrora, substituídos pelo espaço exíguo de uma boxe fria, de uma cama de cimento sob um tecto de zinco, acabam aos poucos por arrefecer-lhes a alma. Alguns resignam-se, tentam adaptar-se. Outros, no entanto, preferem a morte deliberada a ter de viver assim.
Foi o caso de uma gatinha chamada Maria. Não partiu para junto de algum familiar da sua antiga dona que faleceu. Nem partiu para uma qualquer colónia protegida, onde pudesse gozar a sua liberdade. A Maria era a única companhia da dona nos últimos anos de vida. Com a morte da dona, também Maria desistiu de viver e com, persistência e tenacidade, ganhou o direito a um fim, a deixar de sofrer com o abandono, com o desaparecimento súbito de quem amava, da sua casa, do seu espaço, afinal, da sua vida.
A Maria deixou de comer, ficou fraca, ficou doente. Apesar de todos os cuidados e atenções da veterinária e dos voluntários, nada parecia convencê-la a ter vontade de lutar para viver, de se tratar. Num último esforço, as voluntárias da UZ levaram-na para uma clínica onde esteve alguns dias. Tudo foi tentado, mas aquilo que esta gata verdadeiramente queria não lhe podiam dar: a sua dona e a sua casa.
Teria a Maria sobrevivido se tivesse sido tido a sorte de ser adoptada, de ter um novo lar, conforto e colo, ao invés de um lugar numa box gelada de um gatil? Não se sabe.
Há ainda muita gente que duvida que os animais possam morrer de tristeza, por solidão. «Mas como duvidar se essas histórias se vão repetindo? Infelizmente são verídicas», lamenta Isabel.
Casos como o da Maria repetem-se, a União Zoófila está a rebentar pelas costuras, e «não há condições para cuidar de tanta bicharada».
Que mais será preciso ser feito para inverter esta realidade? Por quanto tempo mais haverá pessoas capazes de oferecer cães aos seus filhos como prenda de Natal, comprados em lojas de animais de estimação e que lhes levam 500 ou mais euros por um animal dito de raça? Este Natal seja mais original do que isso, ofereça o apadrinhamento de um animal.




ABANDONOS NA 25 DE ABRIL
As histórias de abandonos não são novas. O que é novo é a «situação macabra» a que se tem assistido nos últimos tempos, segundo conta o senhor Manuel. «Há pessoas que andam a abandonar animais em pontes, como a 25 de Abril e a Vasco da Gama, já para não falar das auto-estradas. Vão com os carros em andamento e atiram os animais janela fora. Parece mentira mas não é. São monstros, só podem ser. Não querem ficar com os animais e nem sequer lhes dão oportunidade de viver».




* Textos e foto publicados no jornal A Capital, na edição de 19 de Dezembro.

- aixnaix (ana k) [ Europe/Lisbon ] 2004/12/23 21:23

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» anapaf ( Ana Paula Fernandes) » [ Europe/Lisbon ] 2004/12/30 18:51
Aqui está um óptimo exemplo de bom jornalismo ! O Jornal e o jornalista estão de parabéns.

» Luisa ( luisa) » [ Europe/Lisbon ] 2004/12/24 16:59
Que texto bonito, chorei, não consigo ler estas coisas sad.gif
Só posso desejar um 2005 em que as pessoas tomem consciência que um animal não se descarta como se de lixo se tratasse, os nossos amigos de quatro patas sofrem mas sofrem mesmo muito quando abandonados sad.gif
Em relação a isso eu tenho feito a minha parte mas gostava de fazer muito mais sad.gif

» netinho ( Sílvia Neto) » [ Europe/Lisbon ] 2004/12/24 10:17
Adorei o artigo, está Optimo. Confeço que até chorei.... vimos tanta coisa hoje em dia mas por vezes acabamos por acreditar q tudo vai mudar e que vai correr bem. Só quando lemos um artigo assim é que "descemos à Terra"....

» Ana Ramos ( Ana Ramos) » [ Europe/Lisbon ] 2004/12/23 22:08
EStá óptimo mas porque será que teem a mania que os animais com fiv + teeem sintomas ao fim de 5 anos etc etc. livra ninguem avisou os meus disso.... FArto-me de rir com isto que vem em todo o lado e só pergunto ...quem foram os vets que fizeram estes estudos? Bom portugueses não deviam ser pois os meus fivs não teem nada a ver com aquilo biggrin.gif

O Artigos está bom e super util e mostra sensibilidade. Esperemos dê alguns frutos

» selenis ( Rute) » [ Europe/Lisbon ] 2004/12/23 21:36
o artigo esta muito bom! de facto a palavra Sida nao e a mais apropriada, mas sem duvida chama a atenção.

desconhecia completamente a versao abandono a alta velocidade :/ gente estupida e sem coração... pergunto-me como seria se lhes fizessem o mesmo!
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