"Gatos e mais Gatos" - encontrei este livro, por acaso, na Feira e recomendo-o vivamente. Aqui fica uma amostrinha :
"Quando os gatinhos já se mexem começa o tempo em que são mais engraçados, mas uma pessoa deseja que se vão embora. Gatinhos por todo o lado, por baixo dos pés, nas mesas, gatinhos nas cadeiras, nos parapeitos, gatinhos escavacando a mobília. Para qualquer lado que se olhasse, uma gracinha preta - porque eram todos pretos, seis gatinhos pretos, o pai branco e cinzento não tivera qualquer efeito no seu aspecto.
E entra eles, gata preta, infatigável, devotada, cumpridora, vigiando-os a cada momento. Bebia muitos mais litros de leite do que queria, porque de cada vez que um gatinho estava perto, ela tinha que ensiná-lo a beber. Comia de cada vez que um gatinho estava perto dum pires. Vi gata preta, obviamente sem apetite para mais uma colherada de comida que fosse, parar quando um gatinho saía do quarto, lamber-se, preparar-se para descansar. Este gatinho ou outro aparecia. Gata preta debruçava-se sobre o pires, e comia, com o som baixo e trinado que ela usa para persuadir os gatinhos. Os gatinhos vinham, sentavam-se curiosos ao lado da mãe, vendo-a comer. Gata comia, mais, devagar, forçava-se a comer. Os gatinhos cheiravam a comida, decidiam que leite quente era melhor, voltavam aos mamilos da gata. Gata preta fazia um som baixo de comando. Os gatinhos, obedientes, iam ao pires e lambiam uma ou duas vezes; depois, tendo feito o que lhes fora mandado, corriam de volta para gata preta, que se deixava cair de lado para os amamentar.
Ou gata preta no caixote de areia. Ela tinha estado no jardim; tinha feito as suas necessidades. Mas um gatinho precisava duma lição. Gata preta vai para o caixote em posição apropriada. Chama os gatinhos: olhem para mim. Fica sentada enquanto eles cirandam por ali, olhando ou não olhando. Quando ela sabe que um percebeu, sai do caixote e senta-se ao lado, encorajando o gatinho, com ronrons e miados, a fazer o que acabou de ver. O minúsculo gatinho imita a mamã. Sucesso ! Gatinho parece admirado. Mamã lambe gatinho.
Os gatinhos da gata preta nunca passam por uma fase de porcaria. Na verdade, como crianças obsessivamente treinadas, ficam ansiosos em relação ao assunto. Surpreendido, enquanto brinca, a alguma distância do caixote, um gatinho dá uma miadela aflitiva; começa a pôr-se na posição adequada - mas, outra miadela deseperada; não é aqui o lugar certo. Gata preta chega a correr para ajudar; gata preta incita o gatinho a ir para o quarto onde está o caixote. O gatinho vai, deixando talvez cair uns pingos, miando. No caixote, que alívio, enquanto a mãe se senta perto, aprovando. Que lindo gatinho limpo eu sou, diz a pose e o focinho do gatinho. Gatinho sai do caixote, é lambido com aprovação: a lambidela aqui e acolá, descuidada, confiante, que é como um beijo. ..........."
Doris Lessing nasceu em 1919, na Pérsia. Passou a infância na Rodésia do Sul. Publicou o seu primeiro romance em 1949, no Reino Unido.
Este livro é um dos que ela consagrou aos gatos da sua vida, desde os que viviam na quinta dos pais em África, até aos citadinos de Londres. Ver "Particularly Cats and Rufus the Survivor" (a história de Rufus começa a seguir ao excerto acima e é lindíssima ) e "The Old Age of El Magnífico".
Um link : www.dorislessing.org/particularlycatsand.html |