[ Europe/Lisbon ] 2006/09/02 16:47 "Hoje fomos ao banho!"
Hoje a minha mãe excedeu-se! Ultrapassou todos os limites! A minha indignação é tal, que direi mesmo que extrapolou todas as suas competências e poderes.
Há já algum tempo, não sei precisar quanto, porque não tenho por hábito usar relógio, nem sequer olhar o calendário, que ela me fazia o seguinte aviso:
- Pipas, vai-te preparando, que um destes dias vou dar-te banho.
Promessas, pensava eu. Com as dores que tens nas costas, isso só vai acontecer lá p'ras calendas gregas.
E fui passando os meus dias, alimentando a vã esperança de que as dores nas cruzes lhe arrefecessem aquela vontade, que eu via crescer dia após dia. Não que eu lhe deseje mal, não, muito pelo contrário. Deu-me tanto trabalho encontrá-la, sofri tanto, passei por tantos sacrifícios, que o que eu mais desejo é que ela tenha muita saúde e paciência para mim, até ao fim dos nossos dias.
Mas banho!? Que diabo! Abdiquei eu, de rebolar na terra, de me enfiar no meio dos arbustos, de me roçar nas rodas dos carros e de ficar todo mascarrado. Tenho impregnado no meu rico pelinho um odorzinho tão agradável! Sou um cãozinho que só sai de casa acompanhado da mãe. Mãe essa, que não me deixa pôr-a-pata-em-ramo-verde. Banho para quê?
Mas hoje, hoje a promessa transformou-se em ameaça e, logo de manhã, mal abriu os olhos, a minha mãe disse-me:
- Pipas, é hoje!
Como gosto de ver a vida pelo lado positivo, pensei: É hoje que ela me vai levar a casa daquela cadelinha amorosa, que vi há dias, e que daí para cá ainda não me saiu do pensamento.
Qual quê, mesmo com dores nas costas, a minha querida mãe, decidiu que de hoje não passava. Pegou em mim, (sorte dela que sou maneirinho) e meteu-me dentro da banheira.
Tive de me render. Era hoje!
Molhou-me todo, (brrffff, não gosto de tomar banho, pronto!) e esfregou-me o corpo com um líquido viscoso que depois se transformou em espuma. Enquanto me submetia a tamanha humilhação, foi falando comigo:
-Vais ficar lindo, com o pelinho muito brilhante e essa pulguinha que te anda a azucrinar há alguns dias, e que eu não consigo descobrir no meio de tanto pelo, também se vai embora assim que sentir a aproximação da água, até vamos bater palmas quando a virmos a deslizar cano abaixo.
Pode ser, pensei, mas também podes ter a certeza que vou amarrar-o-burro e não falo contigo tão cedo.
Só uma coisa me conforta, é saber que não estou sozinho nesta desdita, pois o meu amigo Frick também foi hoje ao banho, mas a esse, não se atreve a minha mãe a ser ela a fazê-lo, é que ele é ligeiramente mais gordinho que eu, pesa só três vezes mais. Para ele a minha mãe chama os serviços de uma empresa. Ainda bem que sou mais pequeno, assim a humilhação não ultrapassa as paredes da minha casa. É um segredo doméstico. É que no caso do meu amigo Frick, toda a gente na rua fica a saber e, gozam com ele, dizem-lhe coisas do tipo: - Ó pá, tás todo limpinho, nem pareces o mesmo!
Vim aqui desabafar e garantir-vos que estou a cumprir a promessa. Não falo com a “carrasca” nos próximos dias.
Pipas
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